Educação: avanços e retrocessos do governo Lula


















A expansão das universidades federais não impediu o crescimento do ensino superior privado e nem a mercantilização da formação. Entrevistas com Moacir Gadotti (Instituto Paulo Freire), Roberto Leher (UFRJ), Augusto Chagas (UNE), Camila Lisboa (Assembleia Nacional dos Estudantes-Livre), Clara Saraiva (Anel), Lisete Arelaro (USP). Ilustrações: Carvani

Por Gabriela Moncau e Otávio Nagoya

Encerrado o ciclo de oito anos do governo Lula da Silva, se faz necessário voltar o olhar para as políticas implementadas em âmbito federal a fim de se estabelecer um balanço crítico e embasado a respeito dos avanços e retrocessos do período. No que se refere à política educacional, o governo do PT pôs em prática uma série de mudanças significativas como o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Novo Enem, o acréscimo de um ano no ciclo do ensino fundamental, a Reforma Universitária que engloba programas e medidas provisórias como o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), o Programa Universidade para Todos (PROUNI), o Ensino à Distância, entre outras, que merecem ser destrinchadas.



Dentre as diferentes avaliações sobre a educação brasileira, uma parece ser consenso: o governo Lula avançou em relação ao governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). “Lula avançou bastante em comparação às políticas anteriores. Em primeiro lugar, no acesso ao ensino superior, a expansão das universidades públicas e federais foi extraordinária. O acesso ao ensino médio foi extraordinário também”, relata Moacir Gadotti, presidente do Instituto Paulo Freire.



Em contraposição, para Roberto Leher, docente da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), houve um avanço explosivo do setor privado da durante os últimos oito anos: “Quando FHC concluiu o seu mandato, tínhamos aproximadamente 30% das matrículas no setor público e agora temos em torno de 24%”. Porém, o professor acredita que antes de fazer um balanço do governo Lula, é necessário contextualizar a realidade brasileira com a educação mundial que, para ele, tem substituído seu papel de produção de conhecimento para simplesmente formar uma força de trabalho mais flexível e desregulamentada. “O padrão de educação superior foi mundializado e chegou ao Brasil. Esse padrão compreende, de fato, que a educação é um negócio. Pode ter alguma regulamentação, mas é um campo aberto para lucro”, define.



Financiamento

Durante a década de 1990, os administradores do Estado brasileiro afirmavam que o problema da educação estava relacionado com má organização de gestão. Essa ideia, que permaneceu durante a década de 2000, é rechaçada pelos educadores. O movimento de educação afirma que o maior problema da área é o baixo financiamento. Durante os últimos 20 anos, a parcela do Produto Interno Bruto (PIB) destinada à educação se manteve em torno de 4%. Em 2000, FHC aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE) que, devido à pressão do movimento social de educação, institui que 7% do PIB sejam destinados à educação pública. FHC, no entanto, vetou esse artigo, mantendo os 4%.



A grande esperança dos movimentos de educação com o Governo Lula era a retirada do veto, aprovando 7% do PIB para educação. Segundo Moacir Gadotti, a não retirada do veto por parte de Lula “é uma das reclamações que fazemos, mas ele fez intermediações e pôs um prazo para aumentar. Além disso, triplicou o orçamento do MEC, isso é uma vantagem.” Augusto Chagas, 28 anos, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) e estudante de Sistemas de Informação na Universidade de São Paulo (USP), compartilha a opinião de Gadotti: “Temos uma marca muito expressiva que é o aumento real de financiamento da educação nesse período. Em 2002, o orçamento do MEC era de R$20 bilhões, hoje é de R$ 70 bilhões”.



Os setores mais críticos ao Governo Lula apontam que o maior financiamento na educação se deve ao ciclo expansivo da economia brasileira, que ocorreu entre 2005 e 2008. “Não foi um aumento em termos relativos, mas sim em termos absolutos em relação aos gastos da união, que permaneceram os mesmos 4% do governo FHC”, destaca Leher. Para Camila Lisboa, 26 anos, estudante de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da Comissão Executiva Nacional da Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre (Anel), o investimento destinado para a educação não é suficiente, já que “o governo gastou 36% do orçamento de 2009 com os títulos da dívida pública. Ao longo dos 8 anos do governo Lula os lucros dos empresários e banqueiros aumentaram 400%”. Também integrante da Comissão Executiva Nacional da Anel, a estudante de Serviço Social de 23 anos Clara Saraiva aponta que o investimento educacional de Lula sofre mudanças de acordo com a situação econômica. “No auge da crise econômica, em 2009, o governo também cortou mais de R$1 bilhão para a educação”, completa.



Um país analfabeto

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2009, a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais é de 9,8% da população, correspondendo a cerca de 19 milhões de analfabetos. Comparado a alguns de nossos vizinhos latino-americanos, estamos bastante atrasados: segundo levantamento de 2007, feito pela Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação (Clade), em Cuba a porcentagem é 0,2%, no Uruguai é 1,9% e na Argentina, 2,8. Não à toa, a professora da Faculdade de Educação da USP e pesquisadora na área de política educacional Lisete Arelaro destaca a educação de jovens e adultos, particularmente no que tange a alfabetização, como “uma das grandes decepções em relação ao governo Lula. É uma dívida social e que se esperava que pudesse ter sido enfrentada em outro patamar de qualidade”.



Para Moacir Gadotti, a alfabetização de jovens e adultos representou uma lacuna no governo Lula, “faltou um plano nacional de erradicação do analfabetismo. Aliás, hoje nós temos o mesmo número e analfabetos que tínhamos quando Paulo Freire foi exilado, em 1964.”. Gadotti conta que, no início do mandato petista, Cristovam Buarque foi nomeado Ministro da Educação e criou uma Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo. Ainda em 2003, foi inaugurado o Programa Brasil Alfabetizado (PBA), com a promessa de erradicar o analfabetismo em quatro anos. No mesmo ano, Buarque é substituído por Tarso Genro e a política de alfabetização é abandonada. “Tarso Genro extinguiu a secretaria e se focou mais na universidade. Em 2005, entra o Fernando Haddad, continuando a política do Genro”, conclui Gadotti.

Confira na íntegra em em http://carosamigos.terra.com.br/

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